Se viva fosse, hoje (dia 18) estaríamos comemorando o aniversário de vovó Zélia. Acho que completaria 85 anos. De todas as pessoas que perdi, sem dúvida nenhuma, é a que me faz mais falta. Só consigo me lembrar de coisas boas dela. Inteligentíssima. Viveu a vida feliz, da maneira que escolheu, o mundo girou em torno dele, quando perdeu o eixo, sofreu durante um período, mas depois passou a registrar na sua mente apenas aquilo o que era conveniente.
Muitos dizem que era fria, distante. Eu acho que ela era calorosa, afetiva, engraçada. Gostava de casa cheia, dava de comida a todo mundo. Sua cozinha era cheia de comadres e agregados, que ela chamava “meu eleitorado”. Não tinha nada decorando a casa, apenas fotos da família, que ela dizia "ser muito bonita".
Repetia as coisas à exaustão. Nos últimos anos de vida, quando queria lavar as maõs e não se envolver em algum problema, sentenciava: “estou saindo do palco”. Se chorava, ou ficava triste, relembrava o quanto havia sido feliz. Adorava ir para UTI de Bernardo, tinha sempre uma maleta pronta, com roupas para os dias que ia ficar internada. Ela sentia o que denominava “a dor”, angina que causava desconforto no peito.
Como todos da família, tinha paixão exasperada por política. Adorava José Agripino (o pai dele foi uma vez apenas consultar o pai dela e ela achava que foi um grande favor) e Rosalba, em grau bem menor. Na verdade ela não gostava de Sandra e Vingt (opinião minha, pode não corresponder a verdade). Tinha foto de Rosalba no banheiro e de José Agripino em porta retrato na sala. Com certeza esse era o único defeito dela, ter foto de José Agripino na sala é dose para leão, pior ainda é ir ao banheiro e olhar para a Rosa.
Sua casa tinha uma fruteira de cajarana, uma prima do cajá. Diz a lenda que quando vovó tinha raiva de alguém “amarrava no pé da cajarana”, puro folclore. Mesmo porque em sua casa também tinha arvores de siriguela e sapoti. Ela não iria amarrar só na cajarana.
Em sua casa morei, ela sempre repetia, “cinco anos e três meses”. Convivência harmoniosa. Não só morei com ela, dormia no mesmo quarto. Todas as noites ela jogava água benta quando eu estava deitado, para tirar onda com ela, fazia o chiado de queimado quando a água tocava em mim. Ela caia da risada. E repetia, “crie juízo”.
Dela escutava que “só sairia daquela casa para o cemitério”, coisa que escutou de Gabriel. E foi o que aconteceu, naquele triste 17 de julho.